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quarta-feira, 28 de junho de 2017

Mobilização e enfrentamento por mais recursos para o SUS marcam propostas do primeiro dia de seminário


A crise política brasileira, as fontes de recursos para o financiamento adequado à garantia do direito universal à saúde e o enfrentamento aos obstáculos que cercam esse objetivo estiveram no centro das discussões do primeiro dia do seminário Saúde sem dívida e sem mercado, em 21/6/2017. Resultado de parceria entre o Centro de Estudos da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ceensp/Ensp/Fiocruz) e o Centro de Estudos Estratégicos da Fiocruz (CEE-Fiocruz), o evento reuniu no Salão Internacional da Ensp os pesquisadores Áquilas Mendes, professor da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, Maria Lucia Fatorelli, coordenadora da Auditoria Cidadã da Dívida Pública, e Carlos Ocké-Reis, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), na mesa Saúde: fontes de financiamento em disputa.

Abrindo as exposições, o professor Áquilas Mendes contextualizou o processo de construção do Sistema Único de Saúde (SUS) e da Seguridade Social para discutir a viabilidade política de uma proposta de financiamento para o setor Saúde. “A saúde vem sendo construída num cenário de contradições, de tensões, embates. O nosso Sistema Único de Saúde e a Seguridade Social emergiram em meio a um quadro bastante problemático, em termos de ataques aos estados sociais, em um mundo atravessado por uma nova ideologia neoliberal”

Segundo Áquilas Mendes, os últimos quarenta anos marcaram um período do capitalismo contemporâneo conformado por uma lógica específica de correlação de forças. “O capital financeiro está cada vez mais presente e vem abocanhando o orçamento público”, afirma. “Parece que não conseguimos mais viver sem dívida, ou melhor, sem o custo do financiamento dessa dívida cada vez mais elevada”, observa o professor, que afirma ser impossível pensar a saúde universal no Estado tal como se apresenta hoje, em meio a uma crise política institucional.

“Precisamos ter clareza de que essa via de construção institucionalizada tem mostrado, cada vez mais, limites muito claros, está quase esgotada”, afirma Áquilas. “Nesse sentido, considerando os problemas do SUS e a limitação do espaço de atuação dos profissionais do setor da Saúde, torna-se necessário caminhar nessa luta por fora, por embate, em uma política de enfrentamento. Nossa luta hoje pela saúde universal é, acima de tudo, anticapitalista”.

A coordenadora da Auditoria Cidadã da Dívida Pública, Maria Lucia Fatorelli, defende que há uma discrepância entre os recursos que o país possui e aqueles de que a população usufrui. “Nossa realidade é de riqueza, é de abundância, mas vivemos em um cenário de escassez, com crise para todo lado. Não há dinheiro para nada, 90% da população brasileira são pobres ou miseráveis, a classe média está diminuindo brutalmente, e os meio por cento mais ricos concentram 43% do patrimônio declarado”, analisa a pesquisadora, que questiona a opção do governo pelos ajustes fiscais. “A justificativa usada para todas essas reformas é a necessidade dos ajustes fiscais, que cortam os gastos sociais, os financiamentos em toda estrutura do Estado, para sobrar mais dinheiro para chamada dívida pública”, aponta.

Segundo Maria Lucia Fatorelli, a separação entre a realidade de abundância e o cenário de escassez deriva da adoção de um modelo econômico planejado para ser concentrador de renda e riqueza. “Temos uma política monetária suicida realizada pelo Banco Central, um modelo tributário regressivo que tributa, principalmente, o salário dos trabalhadores e o consumo. Temos o sistema da dívida que exige ajustes fiscais, privatizações, contrarreformas e novos esquemas que não param de gerar mais dívida. Isso é diferente do endividamento público legítimo – que pode existir”, observa.

O economista e pesquisador do Ipea Carlos Ocké-Reis, por sua vez, aponta que o sistema de saúde brasileiro passou a funcionar de forma duplicada. “Esse é um ponto importante da discussão, visto que houve uma privatização da Seguridade Social no Brasil”, diz. Segundo Ocké, a clientela do seguro social migrou para o seguro privado, sem mediação pelo modelo de seguridade. “O Estado deveria ter concentrado seus esforços em fortalecer o SUS ou a esfera pública, nesses 25 anos. Entretanto, o setor não contou com financiamento estável, enquanto os planos de saúde contaram com incentivos governamentais, favorecendo-se o crescimento do mercado e a estratificação da clientela”, observa Ocké-Reis, acrescentando que “o SUS, não foi capaz de superar o que eu chamo de processo de americanização perversa, ao qual o sistema de saúde brasileiro foi submetido”.

De acordo com o pesquisador o fato de o Brasil ter definido em sua Constituição a saúde como dever do Estado e direito do cidadão, independentemente de capacidade de pagamento, inserção no mercado de trabalho, ou condição de saúde, não é uma questão menor. “É um avanço muito importante para construção de uma sociedade soberana no Brasil”. No entanto, destaca Ocké-Reis, o SUS está sendo desmontado. “Existe um projeto orgânico e estratégico de fortalecimento do setor privado por esse governo ilegítimo que deu um golpe parlamentar nesse país, atacando a constituição, atacando a democracia”, analisa. “Na atual conjuntura as instituições e entidades que lutam pela Constituição e pelo fortalecimento do SUS precisam se mobilizar em caráter permanente, em torno de um projeto de desenvolvimento sustentável, em defesa da democracia, do emprego e dos direitos sociais e ambientais”.